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  • Foto do escritorHM Macahé

Episódio 42. Jorge Saraiva




OUÇA O EPOSÓDIO:



Jorge Saraiva: “Me chamo Jorge Saraiva, tenho 35 anos. Nasci em Macaé e morei até uns 12 anos de idade. Tenho lembranças muito boas da cidade, passei minha infância toda aí e foi realmente importante como formação. A cidade tinha aquele aspecto um pouco que bucólico, de cidade pequena (ainda era um pouco isso), todo mundo se conhecia, de se encontrar na rua e tal…”


Nascido em Macaé no ano de 1986, Jorge Saraiva iniciou seus estudos musicais na Escola de Música de Villa-Lobos. É bacharel em Piano pela UFRJ, onde também estudou Regência e Órgão. Participou de Masterclasses com Arnaldo Cohen, Clélia Iruzun, Nicolai Lugansky, Maria Clara Gebara de Macedo, Luiz Carlos de Moura Castro, Thomas Mastroianni e Menahem Pressler. Apresentou-se em importantes salas de concerto do Brasil, Letônia e na Alemanha. Em 2014 formou um duo com o violinista e regente inglês David Ashbridge. Estudou regência com Patricia Costa, Carlos Alberto Figueiredo e Maria José Chevitarese. É pianista colaborador dos corais Cantavento-Ferlagos e Rainha Assunta, em Cabo Frio (RJ). Integra o Coro de Câmara da ProArte e o grupo vocal Boca que Usa, com o qual recebeu duas medalhas de prata nas categorias “Música Sacra” e “Coro de Câmara”, no III Grand Prix of Nations (Riga, Letônia), em 2017. Paralelamente às atividades como solista e camerista, desenvolve intenso trabalho pedagógico, tendo sido também professor nos cursos de extensão da escola de música da UFRJ. Desde o ano passado, tem desenvolvido um belo trabalho na “Casa de Petrópolis - Instituto de Cultura”, onde é responsável pela realização dos concertos musicais.


Jorge Saraiva: Eu comecei a estudar música com 12 ou 13 anos de idade, alguma coisa assim. Embora seja de família de músicos, tanto da parte do meu pai quanto da minha mãe, tem maestros, violoncelistas, pianista, acordeonista, etc. E lá em casa, eu tinha flauta de pã, teclado, mas eu só fui estudar música com essa idade, por conta da Beth Carvalho, imagina!! Eu fui a um show dela aqui no Rio, estava morando aqui já e fiquei doido, aqueles músicos e tal, o samba, os instrumentos …


Jorge, além das aulas que leciona na "Casa de Petrópolis - Instituto de Cultura", também é responsável pela realização dos concertos da Casa.

Fonte: soupetropolis.com


Tempos depois eu vi que um dos músicos dela, o Paulinho Aba, que tocava pandeiro muito bem (já falecido, infelizmente), ele tinha uma roda de Choro no “Butiquim do Martinho”, que era um bar muito legal do Martinho da Vila. Fui conhecer e fiquei doido! Era Paulinho, no pandeiro; Manoel, no bandolim; Daniel, no violão de 7 cordas e Deir, no Cavaquinho. Essa roda de Choro é um ambiente muito bom, alto astral e músicas de altíssima qualidade. Nos intervalos eu pedia aos músicos pra pegar os instrumentos, e era sempre o cavaquinho. Acho que eles não gostavam muito, porque eu desafinava tudo, não sabia tocar nada, mas eu tinha curiosidade. Ali eu conheci o Wilson (ele dava aula de cavaco), e comecei a aprender. Foi o meu primeiro instrumento. E depois de um tempo toquei lá com eles, fazia uma participação.


Eu gostava e gosto muito de Choro, sou apaixonado por este gênero e gostava muito de solo, de solar. Todo mundo dizia que não era o ideal solar com cavaquinho e sim o bandolim … Valdir Azevedo, Jacob do Bandolim, Pixinguinha, essas coisas todas eu adorava tocar. Eu toquei durante um tempo, mas chegou um momento que eu sentia falta de mais recursos. Embora o cavaquinho tenha possibilidades muito grandes, eu sentia falta de mais recursos, de um instrumento mais completo. E passei a estudar violão. Eu tenho um violão que era do meu avô, e eu decidi seguir carreira, estudar violão clássico. Sempre gostei de música clássica e ouvia de tudo. Led Zeppelin, é a minha banda do coração. A gente ouvia Enya; as músicas de concerto de todos os períodos; sempre ouvindo muita música, muito rádio… e meu sonho era tocar o concerto de Aranjuez.


Então eu entrei na Escola de Música Villa-Lobos, fiz a prova de admissão do curso básico. É um curso que ainda tem muita procura no Rio de Janeiro e é uma escola muitíssima conhecida. Antigamente era assim: era um curso básico que durava uns 2 ou 3 anos e você fazia, logo que entrava, um período só de matérias teóricas. Após esse período, você escolhia o instrumento. Eu entrei super decidido pra estudar violão, só que fui conhecendo outros colegas tocando - era um ambiente muito profícuo de música e daí comecei a ouvir mais o piano , e me apaixonei. Abandonei o sonho de ser violonista (risos). Foi um investimento grande, na época, e eu comecei sem o piano, não comprei logo de cara. Comecei com um teclado de pilha, de brinquedo, as teclas eram muito pequenas. Depois passei para um teclado de 5 oitavas, e daí decidi levar o estudo a sério os estudos. Estudei com professores particulares também, aqui no Rio. Terminei o curso básico no Villa-Lobos e entrei no curso de nível intermediário na UFRJ, de nível técnico. Fiz a minha graduação (sou bacharel em piano) na UFRJ mesmo, e venho tocando.


Jorge também nos conta sobre suas experiências fora do Brasil…


Jorge: Eu fiz uns concertos lá na Europa, na Letônia, Polônia e Alemanha. Eu tenho também uma devoção muito grande pela música vocal, por canto coral especificamente. Eu fazia parte do Grupo “Boca que Usa” (uma brincadeira com o termo), e a gente participou de um concurso na Letônia - o Grand Prix of Nations - e naquela época nós fomos o único grupo vocal da América Latina a ser selecionado para esse concurso. Então foi o primeiro grupo vocal brasileiro a participar de um concurso dos mais importantes do mundo. Concorremos para duas categorias: música sacra e coro misto à capela, e ganhamos duas medalhas de prata. Foi uma alegria, uma festa. Nessa minha ida, eu aproveitei e fiz uns concertos em Varsóvia e numa cidade da Alemanha chamada Marburg, perto de Bonn, onde nasceu Beethoven. Levei muita música brasileira. Minha experiência na Letônia foi incrível, a gente fez uns dois ou três concertos, além das competições, em Riga (capital da Letônia). E fomos à uma cidade chamada Rezekne, perto da Rússia. Uma sala de concertos incrível, super moderna. Eles lá dão muito valor. Pra você ter uma ideia, o concurso teve uma abertura oficial e teve um desfile (parada dos Coros), pelo centro de Riga. As ruas do centro foram fechadas - com suas ligações - para os Coros passarem. E todo mundo na rua aplaudindo, as ruas cheias de gente. Estávamos desfilando e num certo momento, uma senhora muito simpática chegou e me deu um lírio. Todos muito atenciosos. Fomos muito bem recebidos na Letônia. Lá é o país do canto coral, né! Foi uma experiência incrível e o lugar é lindo!

Coral Boca que Usa no Grand Prix of Nations, em Riga - Letônia. 2017

Fonte: bocaqueusa.blogspot.com


Dali eu fiz uma apresentação particular, um concerto fechado em Varsóvia, com música brasileira para piano (depois do concerto, cada um foi para um lado). Depois vim descendo pela Lituânia, Polônia, República Tcheca, Alemanha. E o último concerto foi na Alemanha, numa escola de música com um salão maravilhoso, e fui muito bem aceito. Porque as pessoas não conhecem esse tipo de coisa, embora tenham internet e acesso, elas parecem que vivem em nichos. Eu toquei F. Mignoni, H. Villa-Lobos, E. Nazareth, Chiquinha Gonzaga, Almeida Prado… e veio uma senhora e disse que não sabia que no Brasil existia esse tipo de música. Veja só que loucura, né?!


Além de excelente músico, Saraiva lançou no ano passado o seu primeiro livro de crônicas “Um Trem Para Qualquer Lugar”, onde retrata, dentre outras coisas, a experiência de suas viagens…


Jorge: O que mais me motivou a escrever isso foram as experiências. Eu escrevo muito, desde que me entendo por gente. Mas foi a primeira vez que decidi publicar alguma coisa. Tem crônicas, soneto, poemas, haikais, algumas reflexões. Tem coisas com muito humor, um certo sarcasmo. Tem de tudo, foi um livro que gostei muito de publicar. As viagens também contam, mas é muito mais, uma observação das coisas ao redor.


Magno: Um universo muito interessante no campo da música é o da “música concreta”, e você tem realizado trabalhos neste segmento. Nos conte mais um pouco, Jorge…


Jorge: Eu tenho essas experiências que sempre guardei pra mim. Meu interesse é no que as pessoas chamam de ruído no fazer musical. Esse interesse surgiu na época da faculdade (UFRJ), eu estudava na Lapa, rua do Passeio, e aquilo era um caos para estudar, sobretudo na hora do rush: carro passando, buzinando, gente gritando, guarda apitando. Isso me chamou a atenção (essa relação com o ruído), quando precisei gravar, uma vez, uma série do Schumann que são as cenas infantis, que ela é cheia de pianíssimos, e eu só tinha um horário pra gravar justamente na hora do rush. Foi uma gravação que saiu cheia de sutilezas e nuances, e no fundo tem carro buzinando, guarda apitando… e eu achei aquilo maravilhoso. Como esses processos se integram - a gente acha que a música de concerto precisa de silêncio absoluto - claro que é o ideal, mas isso também integra o processo de performance. Somos frutos do ruído, não é isso? Ainda mais numa cidade como o Rio de Janeiro! Eu me lembro que eu estudava lá e as salas não tinham isolamento acústico. Aquilo é um caos sonoro e pra estudar era terrível! Outras músicas acontecendo ao mesmo tempo que a minha, isso realmente é um fator que, mesmo treinando a concentração, é um tanto caótico. Mas com o tempo os sons lá de fora não me atrapalharam em nada. Eu até sentia falta de um ruído, de uma britadeira por exemplo. Aquilo é realmente maravilhoso!

Capa do livro "Um Trem para Qualquer Lugar"

Autor: Jorge Saraiva


Uma vez eu gravei uma peça pra cavaquinho e batedeira. Um cavaquinho com corda arrebentada e tal, justamente explorando essa dicotomia entre o estudante de música que não tem o instrumento ideal, as condições ideais de estudo e tendo que lidar com o barulho, o ruído de fora e tantas intervenções. As pessoas acham engraçado, mas okey, nada tinha de humor ali. Tinha uma questão de contextualizar uma realidade. Mas minhas experiências eu gravo e mantenho pra mim, não tenho o intuito de divulgar. Fora essa peça que eu mencionei, que achei super interessante, uma peça curta, tem segundos de duração. E é performática. Embora não apareça, o estudante fica revoltado com aquele barulho todo, de não conseguir estudar. Eu tenho muito interesse em como o ruído se integra à performance. Uma vez eu fui ao Teatro Municipal e tinha um concerto rolando. Lá fora tinha uma manifestação, na época em 2013, e toda hora entrava um som dentro do teatro, as pessoas ficavam indignadas e eu achei aquilo maravilhoso. Como é que a música poderia se apartar de um momento político? Isso é impossível! Minhas experiências com música concreta são neste sentido. O ruído e a música, estão todos no mesmo saco. Pra mim é isso!!



Agradecimentos:

E o nosso agradecimento especial de hoje é para a querida Terezinha Vasconcellos, que nos enviou alguns materiais sobre a Casa de Petrópolis, onde se encontrava o release de Jorge Saraiva com a informação de que ele era de Macaé, motivo pelo qual buscamos o seu contato.


Considerações Finais:


Apesar de sua ligação com Macaé, Jorge Saraiva ainda não teve a oportunidade de retornar à sua cidade natal para tocar. Sobre tocar em Macaé, Jorge fala: "eu adoraria tocar em Macaé. Por mais incrível que pareça eu jamais toquei na minha cidade. Incrível isso, né?!"


Com este episódio no ar, quem sabe, não surge honroso convite para um concerto deste grande pianista da atualidade. O teatro municipal entrará novamente em reforma e seria bastante prudente um convite da Secretaria de Cultura convidando-o para tocar na reinauguração deste importante e emblemático equipamento cultural de Macaé. No mais, qualquer outro convite é louvável para a vinda deste grande músico. Vamos aguardar!


Voltaremos em breve com mais um episódio de HMM. Um grande abraço!


FIM.



Fundo Musical:

  • Sonatina 1, 1ºMovimento, de José Siqueira. Interpretado por Jorge Saraiva ao piano;

  • Meu Butiquim, do disco “Butiquim do Martinho”. 1997;

  • Polonaise Heróica nº6 - op.53, de F. Chopin. Interpretada por Jorge Saraiva na 48ª edição da “Série Jovens Pianistas”, realizada no Teatro Municipal de Cabo Frio. 2016;

  • Water Night, de Eric Whitacre. Interpretado pelo Coral Boca que Usa, na Universidade de Latvia (Letônia), no European Choir Games. 2017;

  • Kinderszenen - op.15, de Robert Schumann. Interpretado por Jorge Saraiva ao piano;

  • Odeon, de Ernesto Nazareth. Interpretado por Jorge Saraiva ao piano.

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